17/11/2008
Esclarecimento – Para que serve uma Fortaleza?
Maurizio Fraboni e Obadias Batista Garcia, coordenadores da Fortaleza do Guaraná Nativo Sateré-Mawé, esclarecem sua versão dos fatos, em resposta à campanha de imprensa e falsas acusações lançadas na COIAB (Coordenação Indígena da Amazônia Brasileira) por Derli Bastos Batista e Jecinaldo Barbosa Cabral, índios Sateré-Mawé. Frente a tão graves falsas acusações, Maurizio e Obadias, registraram ocorrência na policia civil de Manaus e apresentam abaixo sua defesa e versão dos fatos, para esclarecer a real situação.
As falsas acusações
Na última quarta-feira (12), Derli Bastos Batista e Jecinaldo Barbosa Cabral, lideranças da etnia Sateré-Mawé, entraram com uma denúncia no Ministério das Relações Exteriores e na direção geral da FUNAI contra a Guayapi Tropical, uma suposta ONG francesa, e seu suposto articulador no Brasil, o “italiano” Maurizio Fraboni.
Na denúncia, que não é fácil de ser reconstruída através das diferentes interpretações dos jornais, se declara que uma suposta ONG francesa, a Guayapi Tropical, estaria “desviando recursos” adquiridos com a venda do guaraná dos produtores indígenas Sateré-Mawé, pois ela deveria devolver um percentual não definido sobre o valor total das vendas, discriminado por diferentes investimentos sociais, às comunidades produtoras. “Eles” (os índios) vendiam o guaraná a 22 reais o kg e a ONG francesa que de acordo com as denúncias seria representada no Brasil por Maurizio Fraboni, revendia esse guaraná a um valor equivalente a 990 reais o kg., valor altíssimo devido ao “selo Sateré internacional”, que garantiria ao consumidor que está contribuindo para a etnia.
Num recorte, Derli Bastos Batista, apresentando-se como Presidente do CGTSM, afirma que Maurizio Fraboni (pessoalmente ou através da ONG francesa Guayapi Tropical, isso não é claro) teria arrecadaco 1,5 milhões de reais para um projeto de ecoturismo: um hotel de selva, financiado pela União Européia, “mas nunca vimos um centavos desse dinheiro”. “Ele mandou construir uma casa de palha e dois quartos de alvenaria que está abandonada”.
Enfim, o italiano teria lançado um livro na França contando a historia do “guaraná, denominado por ele de warana”, com que estaria roubando a patente do guaraná. Livro que conteria conhecimentos Sateré-Mawé e imagens dos quais não teria sido autorizada a publicação. Todavia, a “ONG francesa” é também acusada de ter tomado compromisso de repassar uma parte do lucro desse livro, que nunca teria sido repassado.
Tudo isso, teria acontecido com a cumplicidade do “ex-presidente” do CGTSM, Obadias Batista Garcia, liderança Sateré-Mawé. Mas a providência pedidas pelos denunciantes seria a expulsão do estrangeiro Maurizio Frabioni.
Esclarecendo a real situação: A defesa
Maurizio Fraboni é italiano regularmente residente no Brasil desde 1997, pois a família dele é brasileira. Atua como um dos coordenadores da Fortaleza Guaraná Nativo Sateré-Mawé, que recebe apoio do Slow Food, e trabalha para a Associação de consultoria e Pesquisa indianista da Amazônia (ACOPIAMA), brasileira, encarregada desde 1996 pelo próprio Conselho Geral da Tribo Sateré-Mawé, de assessorar o projeto integrado autônomo de etnodesenvolvimento do CGTSM, monitorando o impacto social, econômico, ecológico e cultural do mesmo. Uma das suas funções é agilizar os relacionamentos internacionais do CGTSM, com a Guayapi Tropical e muitos outros parceiros, assim não tem fundamento declarar que ele representa a Guayapi Tropical.
Obadias Batista Garcia, o outro coordenador da Fortaleza, é índio Sateré-Mawé do clan Warana, Tuchaua da aldeia Nova União e Primeiro Tesoureiro e coordenador geral do comércio justo e solidário do CGTSM. Idealizador do Projeto Warana que é desenvolvido desde 1993 – na época em que era secretário da COIAB, e depois Presidente do CGTSM durante 12 anos.
Derli Bastos Batista não tem legitimidade para apresentar-se como Presidente do Conselho Geral da Tribo Sateré-Mawé, pois foi afastado em maio desse ano por ter desacatado gravemente o Estatuto da organização, e deverá dar conta das suas atitudes, antes e depois do afastamento, a uma Assembléia Geral do CGTSM regularmente convocada e participada conforme ao Estatuto do próprio Conselho.
A Guayapi Tropical não é uma ONG que arrecada dinheiro, mas sim uma empresa de comercialização de produtos florestais, que, entre outros fornecedores, compra regularmente o guaraná beneficiado industrialmente e exportado pela empresa Agrorisa, que, através do Conselho Geral da Tribo Sateré-Mawé, compra dos produtores Sateré-Mawé cadastrados no Consórcio dos Produtores.
O preço de 22 reais para o guaraná em rama (matéria prima da qual é separada a semente para ser transformada em pó) a vista (ou, a escolha do produtor, 25 reais em duas parcelas) foi o preço ao qual o próprio CGTSM comprou na última safra os grãos de guaraná dos produtores Sateré-Mawé. Esse preço foi negociado publicamente em Maués entre os representantes do Consórcio e a Diretoria do CGTSM, em dezembro de 2007. Esse produto, ou outras matérias primas, adquirido pelo CGTSM, é livremente vendido pelo mesmo e não é destinado só à Guayapi Tropical, mas também a outros mercados, com preferência no âmbito da rede mundial de Comércio Justo (IFAT), da qual o CGTSM participa. Esse preço praticado pelo Conselho Geral da Tribo Sateré-Mawé, era naquele momento o maior preço no mercado mundial do guaraná. Quanto ao preço final de uma matéria prima que, ao longo de uma complexa fileira chega de alguma forma aos consumidores finais nas prateleiras das lojas, deveria ser óbvio que isso não depende nem do CGTSM nem da Guayapi Tropical, a qual também dessa fileira representa só um segmento.
O “milhão e meio de reais” é provavelmente um valor de fantasia, mas que se refere explicitamente a um projeto de cooperação internacional financiado e monitorado pela União Européia, e realizado por uma ONG italiana, e no âmbito do qual, entre várias intervenções em favor das populações indígenas e ribeirinhas do médio e baixo amazonas, foi realizado com grande êxito (que todo mundo pode conferir indo visitar) um espaço de ecoturismo, a aldeia de Vintequilos, em parceria com o CGTSM. A gestão desse projeto não viu em nenhum momento a participação de Maurizio Fraboni, assim que ele não poderia ter nem arrecadado nem desviado esse dinheiro. Porém, a realização do projeto mereceu declarações de aprovação entusiasta por parte do próprio Derli Bastos Batista, no dia da inauguração oficial da estrutura, declarações recolhidas pelo jornal de Parintins “Parintins em Tempo” e publicadas no dia 16 de junho de 2007.
O apoio à realização do livro “Le Guaraná, trésor des indiens Sateré-Mawé” (O Guaraná, tesouro dos índios Sateré-Mawé) de Bastien Beaufort e Sebastien Wolf (que visitaram a área indígena a convite do CGTSM em 2007) foi iniciativa autônoma da Guayapi Tropical, mas constitui de toda maneira parte integrante da atividade de rotina voltada a promover o guaraná legítimo dos Sateré-Mawé, assim como a promover a determinação com que o Povo Sateré-Mawé defende a conservação do santuário ecológico do Guaraná nativo: uma luta em prol de si mesmo, mas também no interesse da Nação brasileira e da Humanidade. Essa atividade de promoção e divulgação é cobrada com firmeza pelo próprio CGTSM, como pré-condição básica da parceria, a todos seus parceiros, comerciais ou não. Os textos que estão incluídos contendo lendas indígenas não foram coletados na área indígena pelos dois autores do livro: são traduções ou novas publicações de textos já publicados por vários autores desde muitos anos e citados na bibliografia. A versão publicada da lenda do guaraná é aquela bem famosa e mais clássica de todas, coletada por Nunes Pereira e publicada no livro: Os índios Maués. Rio de Janeiro: Ed. Simões, 1954.
O patenteamento dos nomes “Sateré”, “Mawé”, “Sateré-Mawé”, e muitos outros ligados à cultura da etnia por parte de empresas que usam essas marcas desde muitos anos não parecem levantar o interesse dos denunciantes. Mas o apoio à auto-organização dos produtores para construir um protocolo de produção e ver reconhecido como de uso exclusivo o nome waraná para o produto efetivamente produzido pelos Sateré-Mawé na terra deles, a Terra indígena Andirá-Marau (apoio levado a frente através da Fortaleza e citado e documentado no livro de Bastien Beaufort e Sebastien Wolf), parece fazer o objeto do maior escândalo. O que Derli Bastos Batista e Jecinaldo Barbosa Cabral chamam de “selo sateré internacional”, nada mais é que o emblema, encomendado na época pelo CGTSM, que representa simbolicamente a terra de origem do waraná: o rio Andirá (representado pelo morcego) e o rio Marau (representado pela rã). Esse selo não é de propriedade da Guayapi e nem de ninguém, mas foi elaborado para constituir o primeiro passo rumo a uma proteção da denominação de origem que seja garantida pelo poder público. A Guayapi Tropical se antecipou voluntariamente, alguns anos atrás, em cumprir um ato devido aos produtores Sateré-Mawé, que espera-se seja obrigatório, num próximo futuro, para qualquer comprador.
Parece uma atitude absurda, mas foi em plena coerência com essa atitude que, em maio desse ano, Derli Bastos Batista convocou, sem consultar a Diretoria, uma assembléia minoritária para formalizar uma ata que legitimaria, a seu ver, através de uma mudança do Estatuto do CGTSM, o cancelamento sem mais nem menos do Consórcio dos Produtores e de qualquer representação autônoma dos Produtores no Conselho. Pelo que diz respeito às razões desse ataque desconsiderado, caberá aos órgãos competentes apurar a verdade.
Até aqui o esclarecimento por parte dos coordenadores da Fortaleza do Waraná.
A rede Terra Madre informa que continua apoiando a etnia dos Sateré-Mawé e a Fortaleza do Guaraná Nativo Sateré-Mawé.
3 Comentários
1. eduard lopes | 17.11.08 às 12:37
Existe pessoas bem ou mal-intencionadas em todos os lugares. este é um exemplo de má-intenção vindo de um lugar onde o trabalho solidário e o reconhecimento de um produto causam inveja e alguns acabam tendo tipo de atitude.
2. Jerson Jose de souza | 17.11.08 às 5:55
Acreditamos que temos que ser cada vez mais fortes, e mais objetivos e cuidadosos, o minimo detalhe pode levar a infelicidade da queles que não querem ver empreendimentos de sucesso. Nós que fazemos parte da família slow food, precisamos estar unidos para vencer todas as dificuldades que vierem pela frente, pensar sempre que nosso objetivo será alcançado, porque somos guerreiros fortes.
3. irasatere | 4.04.09 às 7:06
Pena que existam essa divisão politica dentro do povo Satere-mawe.Esperamos que esses conflitos sejam resolvidos,para que o projeto guaraná possa se fortalecer cada vez mais.