28/02/2008
Morre aos 52 anos Vanderlei de Castro, um defensor do Cerrado
Brasília (27.2.08) – O Brasil perdeu na madrugada desta quarta-feira (27) um os principais defensores do uso sustentável da biodiversidade do Cerrado. Vanderlei de Castro, 52 anos, faleceu no município de Diorama, na região do Médio Araguaia (GO). Foi lá que o socioambientalista – considerado um “teórico da terra” – criou em 1996 a organização não-governamental Centro de Tecnologia Agroecológica de Pequenos Agricultores (Agrotec).
Destinado à produção de medicamentos fitoterápicos com princípios ativos das espécies nativas do Cerrado, o Centro tornou-se referência no Brasil por materializar uma experiência-piloto que envolve conhecimento tradicional, tecnologia, uso sustentável da agrobiodiversidade e geração de emprego e renda para agricultores familiares. A Agrotec identifica e reproduz plantas nativas com princípios ativos para 20 produtos fitoterápicos. A Organização conta com 21 associados diretos e centenas de beneficiados indiretos, a maioria deles agricultores familiares e gente simples do Cerrado.
A partir da iniciativa conduzida por Castro foi possível chegar a um protocolo de intenções entre os ministérios do Meio Ambiente, Agricultura, Desenvolvimento Agrário, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e FIOCRUZ. O principal objetivo do protocolo é criar um modelo para a adoção dos fitoterápicos brasileiros no Sistema Único de Saúde (SUS).
A experiência começou a ser implantada este ano nos postos de saúde de cinco municípios de Goiás: Diorama, Aragarças, Montes Claros, Piranha e Jussara. Nesses locais, a população teria acesso gratuito a medicamentos feitos com plantas da região a partir de receituário médico. O projeto serviu como inspiração para o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.
Teórico da terra
Filho de pequenos agricultores,Vanderlei Castro se formou em Psicologia. Mas, na década de 1970, ele deixou a profissão para se juntar a uma equipe de cineastas ingleses, com os quais passou 10 anos filmando na Amazônia a série “A década da destruição”. Exibido na Europa, o documentário foi um dos estopins do movimento internacional que culminou com a realização no Brasil da RIO-92, a conferência mundial sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
O contato com os povos da floresta durante as filmagens do documentário permitiu a Vanderlei de Castro vislumbrar formas de uso sustentável da biodiversidade brasileira. Castro foi um dos pioneiros na proposição de um modelo de manejo de animais silvestres para fins de geração de renda para as comunidades.
Sua experiência na floresta também deu a ele condições de vislumbrar estratégias de articulação entre índios e não-índios que resultaram, entre outras iniciativas, na Aliança dos Povos da Floresta. Como boa parte da população brasileira, ele também contava com ancestrais indígenas, no seu caso, da etnia Bororo.
A atuação de Vanderlei de Castro é considerada imprescindível para o estabelecimento de políticas públicas para beneficiar as comunidades e os povos tradicionais do Cerrado, bioma que deve muito a ele em relação ao estabelecimento de tecnologias agrárias de baixo impacto. Seu trabalho foi todo voltado para beneficiar o meio ambiente e as pessoas diretamente ligadas à terra. Deixou esposa e dois filhos.
Depoimentos:
“Ele amou, primeiramente, a Amazônia e seus povos e, depois, o Cerrado e ospovos que viviam em harmonia com o meio ambiente. (…) Sentiu em seu coração como deveria atuar para a proteção dos conhecimentos tradicionais dos povos que habitam o planeta, especialmente os povos que lutam pelo direito à vida”.
Severiá M.Idioriê Xavante (Educadora/ Associação Aliança dos Povos do Roncador)
“Vanderlei de Castro tinha um desafio que era integrar a medicina tradicional ao sistema de saúde pública no Brasil”.
Consolación Udry (Pesquisadora/Secretaria de Desenvolvimento Sustentável e Cooperativismo/Ministério da Agricultura)
“O Cerrado, seus povos e as organizações que trabalham por essa causa perdem um grande e incansável companheiro de luta, mas fica seu exemplo”.
Andréa Lobo/Antropóloga/Presidente do Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN)
“Ele foi um dos pilares do socioambientalismo no Cerrado”.
Donald Sawyer (Sociólogo/Professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da UNB)
“Obstinado, ousado, Vanderlei ajudou a abrir novas fronteiras para a conservação do Cerrado”.
Mônica Nogueira ( Antropóloga/Coordenadora da Rede Cerrado)
“Era um lutador das causas comunitárias. Trabalhava pelo coletivo”.
Rubens Nodari (Gerente de Recursos Genéticos/Sec. de Biodiversidade e Florestas/MMA)
“Vanderlei era uma agenda inexistente”
Mauro Pires (MMA)
6 Comentários
1. Roberta Sa | 28.02.08 às 11:39
Vanderlei participou de todas as edições do Terra Madre e era o verdadeiro Intelectual da Terra, contribuindo muito com a evolução de nossa rede.
O Cerrado e o Brasil perderam uma força importantíssima da luta pela conservação da biodiversidade e pela defesa da dignidade dos extrativistas e homens e mulheres da terra.
Tenho a impressão que onde quer que ele esteja, já está fazendo de tudo para mudar as coisas e tornar o lugar melhor e mais justo.
2. Claudivã Matos | 28.02.08 às 3:09
Vanderlei, Grande entusiasta das questões ambientais e exemplo de determinação. Devemos agradecer sua grande contribuição para uma maior harmonia homem e meio ambiente.
Biól. Claudivã
3. Divani Ferreira de Souza | 29.02.08 às 8:01
Continuará Vivo!
Vanderlei continuará presente!
Sua vida foi plantar sementes, acreditar no poder das sementes e lutar para que as mesmas sobrevivessem ainda que em terreno inóspito.
E ele nos deixou uma sementeira.
Era impossível conviver com o Vanderlei sem se deixar tocar por sua intensidade e também teimosia.
Ele continuará vivo porque, as sementes e aqueles que plantas sementes, nao morrem. Não neste sentido literal literal da morte como fim.
Em nós sobreviverá este desejo de lutar pela biodiversidade ( do cerrado, da amazônia…) e pela concretização de políticas públicas que assegurem aos Agricultores familiares os Direitos fundamentais.
Em especial o direito á vida.
À vida com dignidade.
Viva Vanderlei.
4. João Roberto Correia | 29.02.08 às 9:45
A paixão de Vanderlei sobre o Cerrado e seus povos, sua garra na defesa e na busca por alternativas sustentáveis de uso e manejo nos coloca ainda mais o compromisso de continuar a favor da vida.
Descanse em paz
5. Vilma Moreira-professora Ling. port e Ling Espanhola Diorama-Go | 6.03.08 às 10:57
Vanderlei, tivemos o prazer de te-lo aqui em nosso meio, ativo, indagador, tenaz, forte e vivo!
Como sinto Diorama eo mundo ter perdido essa mente!
Nunca preocupei em dizer o quanto o admirava e que seguramente foi o ser humano mais inteligente que conheci. Agora que se foi provavelmente os que não o compreendia e teimavam em não ouvir o seu grito no deserto de informações em que vivemos quererão correr atrás e infelizmente não poderão contar contigo!
O mundo vai falar em você e o minimo que poderei dizer na escola que ensino é que entre nós viveu Vanderlei de Castro!
Descanse em paz, seus sonhos serão idealizados!
6. Raul Zanforlin | 7.03.08 às 10:31
Não comnheci o Sr. Vanderlei, mas, pela informação da Terra Madre Brasil, fica claro a importância do trabaho deste Brasileiro e digo, que se faz de carater urgente principalmente por aqueles que o conheceram, que se escreva sua biografia para que todos aqueles que lutam pela preservação da vida em todos os sentidos, sinta-se instimulados a continuar os seus projetos e pesquisas que são fundamentais para estruturar as bases de uma nova cultura para as próximas gerações. Eu também que sou defensor deste novo paradigma, estou profundamente sensibilizado sentindo seu pensamento pedindo a Deus que o abençoe e permita que Ele onde estiver possa dar continuidade através de todos a inspiração para a compreenção do conhecimento desta grande causa. Eu acredito criticamente na continuidade da Vida, por isso escrevo dizendo: Ao Ser, ao Homem, ao Cidadão, ao Amigo, ao Irmão… Até Breve!